Nos
últimos dias, para minha surpresa descobri que já não estamos mais sozinhos
quando defendemos a esquizofrenia
regulatória da Agência Nacional de Saúde – ANS. Para minha surpresa, o
noticiário da Rede Globo (Jornal Nacional), se engajou no debate relacionado ao
engessamento do Sistema Privado de Saúde, promovido pela ANS.
Maior
surpresa ainda foi ouvir no meio da matéria, os comentários de um dos
representantes das entidades classistas do setor privado, admitindo como
“normal” as dificuldades vividas pelos usuários e microempresários envolvidos
na matéria. “Admitir o alinhamento do
setor privado às políticas e diretrizes do SUS e da própria ANS, é uma
incongruência jamais vista. É o mesmo que dizer: agua e vinho são coisas
iguais!
Em
2016, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), cobrou das Operadoras de Planos
Coletivos o equivalente a 1,6 bilhões de reais por atendimento realizados aos
trabalhadores, na rede pública. Este valor, denominado de RESSARCIMENTO, representa um crescimento de
133.7% em relação ao valor cobrado no ano anterior (709 milhões). Alguém
acredita que tais valores não tenham nenhum impacto nos custos do benefício de
forma direta para as empresas?
Faço
esta introdução para acrescentar que os Planos Coletivos Empresariais, representam
mais de 60% da cobertura por Planos de Saúde, representando quase 5% do PIB
Nacional. Se confirmadas as teses de que
cada brasileiro custa para o SUS, algo em torno de R$ 1.415,00 (pesquisa da
CFM) teríamos um custo mínimo global no orçamento público na ordem de R$ 43
bilhões de reais, desonerados em favor do
público.
Esta
liberdade, regulatória, auto/assumida pela ANS, produziu duas excrescências
ainda não percebidas e resolvidas nem pelo governo, nem pelo congresso e o que
mais me surpreende, nem pelos
empregadores da indústria e comércio que paga a maior fatia da conta: O ressarcimento ao SUS e a ampliação do
Rol de Serviços e procedimentos. Poucos lembram que das dez maiores
economias do mundo, só no Brasil a
despesa privada é maior que a pública. Esta informação, deveria dar aos
Gestores empresariais a dimensão do
valor e poder sobre o processo regulatório auto imposto pela ANS, sem
nenhum enfrentamento, como dizem alguns para minha surpresa, “tudo está
pacificado e dominado”.
Como já apontamos, 4,2% é o impacto
nos custos relacionado ao Ressarcimento, mas é preciso ainda
acrescentar as decisões unilaterais da Agência em aumentar o Rol de
procedimentos, na cobertura que certamente resultará num incremento de custos
na ordem de 6% a 11% dependendo das
características de cada operadora e seu perfil de atendimento.
O
fato é que há pelo menos 30 anos convivemos com uma Legislação confusa,
contraditória e fragmentada que facilita as decisões baseadas no princípio da
“equidade”, ao invés da Legalidade.
Ora,
a saúde é um direito assegurado constitucionalmente ao todos os cidadãos
brasileiros, não havendo como impedi-los de fazer a opção pela rede pública,
seja ambulatorial, seja hospitalar, o
que também não permite a própria ANS.
Aqui
reside o primeiro contraditório
conceitual: não há como uma operadora garantir que seu beneficiário utilize seu
plano na forma como foi contratado, pois o prestador do serviço que poderia
ajudar-lhe pode ser penalizado, caso pratique esta conduta (sic).
De
igual forma, não há como obriga-lo a realizar o procedimento pelo Plano de
Saúde, uma vez que ele possui o “DIREITO CONSTITUCIONAL” de utilizar o SUS. Assim, deveria caber ao cidadão, de
forma exclusiva, escolher qual atendimento quer ter, o privado pela livre adesão que a
lei lhe concede e/ou um público pela obrigatoriedade de pagamentos de impostos.
Mais
uma vez, a esquizofrenia regulatória da ANS se manifesta quando se constata que
a Tabela de Preços utilizadas pela Agência para cobrança do ressarcimento é 5
(cinco) vezes maior do que a tabela utilizada pelo SUS para pagar a rede
credenciada.
Uma
das diferenças entre o Processo de Governança Pública e Governança Privada
reside no fato de que a Governança Publica,
só pode fazer escolhas e caminhos no âmbito da Lei. Já no âmbito das relações entre pessoas privadas, se aplica o princípio
das “autonomias de vontades” que lhes permite fazer tudo aquilo que a lei não
proíbe”. O artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal repetindo preceito
de constituições anteriores, estabelece que “ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude da lei”. Ora, se a CF no artigo
199 afirma que a Saúde, é livre a
iniciativa privada, não sendo portanto concedida, ficando o cidadão com o
livre direito de aderir ou não, não pode neste caso o Poder Público praticar a incoerência de primeiro “autorizar”
a livre iniciativa e a posteriores dizer, impor ou criar obrigações, que para
tanto dependa também de Lei.
Quando
uma empresa resolve conceder o benefício de plano de Saúde a um funcionário, ou
quando este resolve por vontade própria adquirir um Plano Individual, não pode este mesmo cidadão ficar privado
dos serviços públicos de saúde. O DIREITO é dele e do seu empregador.
Parece
que a missão da ANS é fazer valer o princípio da “ditadura regulatória” se
apropriando de recursos privados como se fossem públicos. A impressão que tenho
é que no fim a ANS, tem como propósito mesmo, estabelecer o SEU PRÓPRIO SISTEMA
DE SAÚDE, colocando as operadoras privadas para atenderem a todos de forma universal, mesmo os não conveniados.
São
estes os argumentos que fundamentam a necessidade premente de uma agenda de
reformas que recrie um Sistema Nacional de Saúde, que reconheça a função pública
e a função privada, como sendo uma agenda priorizada. Todo o resto, incluindo o
Ressarcimento e a inclusão do Roll, são questões pontuais, que podem ser
resolvidas, mas estarão de volta na pauta se questões estruturantes do Sistema
de Saúde não sofrerem alterações, que há mais de 30 anos são reclamadas.
Norival R Silva
Consultor
Febraplan
Fevereiro de 2018
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