Norival R Silva – 20
janeiro 2020
Há muito
tempo ouvi de uma iminência em gestao de saúde, Dr. João Candido (in memoriam),
que a área da Saúde representa a mais complexa de todas as políticas públicas e
atividades de gestão. Dizia Dr. Candido que o cenário é tão complexo que as
vezes leva gestores a se enveredar pelo caminho do indivíduo que quer escrever
uma carta de amor: começa sem saber o que dizer e termina sem saber o que
disse...
Claro que não
é preciso ser muito “especialista” para entender que os Mercados de Saúde não
se compõem pelas características de um mercado tido como “perfeito”, no qual a
racionalidade de objetos e necessidades além do conhecimento sobre o “uso” por
parte do consumidor, sejam os componentes básicos. Ou seja, nenhuma das
condições de perfeita competição de mercado estará presente quando se fala em
sistemas de saúde, seja público, ou privado. No Sistema de Saúde Suplementar,
deveríamos ter Gestores (Operadoras) e prestadores (Hospitais, Profissionais,
Produtores de Insumos, Materiais e medicamentos), atuando com interesses
comuns: resolver o problema do consumidor e remunerar o capital, lógica natural
do setor privado, no qual todos os atores envolvidos nesta “cadeia” tenham
resultados de remuneração justos e atrativos para todos, do contrário ele entra
em crise e se desfaz. Então, o que está de fato ocorrendo no setor? Eu não
tenho dúvida, a questão é primordialmente regulatória. A ANS, o órgão que
deveria assumir o papel de árbitro deste jogo, não sabe como começar o jogo e
termina quase sempre sem saber como ele terminou.
É neste ponto
que se torna visível a “fúria regulatória” da ANS, que se excede no “zelo”,
chegando ao ponto de querer transformar o capital privado como se fosse
público. Sem a menor participação do setor, introduz no sistema itens que
inevitavelmente irão produzir elevação de preços e de competição no mercado sem
que o Governo de uma forma geral se manifeste sobre o assunto. Assim, é fácil de
entender porque saímos de um cenário com mais de 1800 operadoras para chegarmos
a 780 operadoras ativas, números que ainda irão se alterar por conta das
operadoras sob intervenção. Já a segunda função da ANS, de ser o árbitro do
mercado na conciliação dos interesses dos atores envolvidos na “cadeia”, torna
ainda mais confuso o início e o fim da “carta de amor”.
Aqui, preciso
finalizar esse texto senão corro o risco de não saber como terminá-lo. É
preciso deixar o registro que exigirá pelo menos mais dois artigos,
relacionados a questão estrutural e de função regulatória que está por exigir
uma agenda de reformas em primeiro lugar na Legislação e em segundo nas regras
e procedimentos que deveriam regular o mercado: Tabelas de preços
normatizadoras e atrativas para todos, olhar fiscalizador da ANS para a Rede
Prestadora de Serviços; ampliar a representatividade das operadoras de planos e
seguros de saúde (Grandes, Médias e Pequenas) no Conselho Nacional de Saúde
suplementar que deveria ficar subordinado ao Gabinete do Ministro da Saúde com
o papel de normatização do setor; uniformizar a atenção sobre planos individuais
e coletivos; menos conflitos de interesses entre fabricantes de insumos e
materiais que descaradamente induzem a rede de serviços a prescrição com preços
fora do mercado e incentivos paralelos.
As pessoas
ainda não se deram conta, que mantida a restrição orçamentária para 2019, vamos
caminhar para uma crise sem precedentes no Sistema Público de Saúde. Se o
Gestor Federal quer de fato desonerar o Sistema Público de Saúde (SUS), é
preciso mexer nos buracos negros da legislação atual: Lei 8080/90 e Lei 9656/06
pelos quais as irregularidades e condutas caminham e especialmente buscar uma
grande pacto federativo para garantias de cumprimento não só dos dispositivos
legais já existentes, mas especialmente a garantia de cumprimento das regras e
contratos pactuados livremente entre consumidores e operadores de saúde, que
através da Judicialização, de maneira imprevisível consome uma boa parte dos
recursos do setor. Preciso terminar dizendo que a retomada do crescimento do
setor suplementar, que nos últimos 5 anos perdeu mais de 3 milhões de usuários
e permanece estagnado nos dias de hoje, não se dará pela oferta de planos mais
acessíveis, mas sim pela renovação do processo de governança do mercado,
posicionando a ANS, como uma agência que de fato estimule a ampliação do
Mercado, os interesses dos usuários e a desoneração do SUS. Ao invés de se
manter com sua esquizofrênica “fúria regulatória”, exterminando pequenas e
médias operadoras, gerando mais encargos (tributos falseados) para o
contratante de planos coletivos e se “debatendo” para garantir sua própria
sobrevivência, sem se preocupar com o inicio ou o fim da carta de amor...
Norival
R silva
Consultor de Governança & Marketing
Palestrante e
Consultor na área da Saúde e Desenvolvimento Humano, com especialização na área
da Promoção da Saúde e Qualidade de Vida; Experiência vivida como Gestor de
Sistemas Privados e Públicos (SUS) de pequeno e grande porte; Idealizador do
Programa Bata na Porta Certa – Ensinando a Usar o SUS Corretamente; atual
consultor sênior da Gestão Saúde para assuntos relacionados à Regulação,
Marketing e Atendimento no âmbito do Sistema Público e Privado, Idealizador do
modelo de Regulação Prudencial, Mais de 1500 participantes treinados em eventos
de Gestão, Regulação e Atendimento.
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário